Há 36 milhões de anos começou a formar-se a plataforma dos Açores, sobre a qual emergiram as nove ilhas (além de vários ilhéus e numerosos vulcões submarinos) que hoje conhecemos.
As ilhas encontram-se distribuídas por três grupos. O ocidental é constituído pelas ilhas do Corvo e das Flores, o grupo central pelas ilhas Graciosa, Terceira, S. Jorge, Faial e Pico e o grupo oriental pelas ilhas de S. Miguel e de Santa Maria.
A superfície total do arquipélago é de 2.344 km2, e a sua altura máxima corresponde ao topo da Ilha do Pico, com 2351 m. Este é também o ponto mais alto de Portugal, país ao qual pertence (é território autónomo).
A zona ocupada pelos Açores no oceano Atlântico é bastante acidentada, sendo a junção de três placas litosféricas, pelo que ainda hoje existem 26 sistemas vulcânicos considerados ativos (oito dos quais submarinos).
Na ilha de S. Miguel, a maior de todas do arquipélago, encontram-se ativos os cinco vulcões ou sistemas vulcânicos que lhe deram origem, sendo eles o vulcão das Sete Cidades, do Fogo e das Furnas; e o sistema vulcânico fissural dos Picos e do Congro.
Ao olharmos para o mapa de S. Miguel é possível perceber que a localização das lagoas está relacionada com os vulcões que deram origem à ilha. Quando um vulcão está inativo durante algum tempo vão-se acumulando águas pluviais na sua caldeira, acabando por se formar lagoas. Foi assim que se formou a Lagoa das Sete Cidades, a do Fogo e a das Furnas. E são paisagens lindas, pontos obrigatórios numa ida a esta ilha.
Eu estive cinco dias inteiros em S. Miguel, não contando com os outros dois dias das viagens de avião entre os Açores e Lisboa.
Deixo aqui o meu roteiro nesses dias. Utilizei sempre carro, penso que é a melhor forma de viajar pela ilha. Uma vez que a ilha não é grande, optei por dormir sempre em Ponta Delgada.
Dia 1
1 – Lagoa das Sete Cidades, de Santiago e Rasa
No interior do monumental vulcão das Sete Cidades encontram-se quatro lagoas, sendo a mais conhecida a chamada Lagoa das Sete Cidades que no fundo são duas que comunicam entre si. São elas a Lagoa Azul e a Verde. O istmo que as separa foi criado pelo Homem, para facilitar o percurso que começou por ser feito de barco.
Esta é uma paisagem protegida, reserva natural e uma das Sete Maravilhas Naturais de Portugal. Era também um território isolado, o que abria caminho para o aparecimento de várias lendas e contos. A mais conhecida era a da princesa que conheceu um pastor por quem se veio a apaixonar. Mas o seu pai já a tinha prometido a um príncipe de um reino vizinho e quando contou à sua filha ela ficou desolada. Ao saber a notícia foi ter com o pastor e juntos choraram tanto que das suas lágrimas se formaram as lagoas azul e verde. A Lagoa azul veio das lágrimas dos olhos azuis da princesa e a Lagoa verde dos olhos verdes do pastor…
2 – Miradouro da Vista do Rei e da Grota do Inferno
A partir do miradouro Vista do Rei é possível observar a Lagoa das Sete Cidades, assim como a povoação com o mesmo nome. É um dos mais belos locais de Portugal e um autêntico cartão postal de S. Miguel. É um local muito turístico mas absolutamente deslumbrante.
Mas uma paisagem ainda melhor é a que podemos ver do miradouro da Grota do Inferno, localizado na Mata do Canário. Daqui é possível observar as quatro lagoas que fazem parte do vulcão. Além da Lagoa das Sete Cidades é possível ver também a Lagoa de Santiago e a Rasa. É o local perfeito para perceber a extensão do vulcão.
3 – Ponta da Ferraria e Praia dos Mosteiros
Na Ferraria e na praia dos Mosteiros existem nascentes submarinas provenientes do vulcão das Sete Cidades. Por esta razão estes locais são ótimos para entrar na água do mar, sendo as zonas mais quentes da ilha de S. Miguel.
Na Ferraria a água da sua nascente tem uma temperatura de 61,8ºC e quando chega ao mar pode variar entre os 18 e os 28,1ºC, de acordo com a maré. É uma piscina natural, junto à qual existe também um complexo termal, com Spa e restaurante. Além da sua beleza e interesse científico a Ferraria tem ainda águas termais cujas propriedades terapêuticas levam muitas pessoas até aqui.
Também interessante é a praia dos Mosteiros que possui um extenso areal negro com grandes formações rochosas. Delimitadas por estas estruturas encontram-se piscinas naturais.
4 – Ponta do Escalvado
A partir do miradouro do Escavaldo, localizada no topo de uma rocha escarpada, é possível observar a Ponta da Ferraria e a o areal da praia dos Mosteiros. Na minha opinião, é a melhor vista para a costa oeste da ilha.
Noutros tempos era aqui que funcionava o posto de vigia para a caça à baleia.
Dia 2
5 – Ponta Delgada
Ponta Delgada é a capital da ilha e de todo o arquipélago desde 1546 (antes era Vila Franca do Campo) e o seu centro económico. Localiza-se no extremo oeste de S. Miguel, numa zona invulgarmente plana, que não é muito comum ver nesta ilha.
Há dois séculos Ponta delgada sofreu um enorme desenvolvimento económico devido à exportação de laranjas para o Reino Unido, o que levou ao aparecimento de proprietários rurais endinheirados, com um estilo de vida ostensivo. Surgiram palacetes lindíssimos e jardins de estilo romântico, numa povoação cada vez mais bonita, numa imitação do gosto inglês.
A exportação da laranja foi substituída pela do ananás e surgiram as fábricas de laticínios e de chá que permanecem relevantes até hoje.
Um outro aspeto que foi crucial para o desenvolvimento da economia de S. Miguel (e dos Açores) foi a chegada de judeus, no ano de 1819. Mas a sua presença não durou muitos anos. O declínio da exportação da laranja e o aparecimento de pautas aduaneiras menos favoráveis, fez com que tivessem partido em busca de novas oportunidades.
Apesar desses anos áureos já serem passado, Ponta Delgada continua a ser uma cidade muito interessante e em termos de riqueza a mais importante de todo o arquipélago dos Açores.
Numa viagem a S. Miguel recomendo dedicar pelo menos uma manhã ou tarde a Ponta Delgada. É uma povoação simpática com casas brancas e pretas, com muita utilização de pedra basáltica.
A não perder as Portas da Cidade, a Igreja Matriz e a de São José, o Forte de São Brás, a Câmara Municipal, o Convento e Capela da Esperança, o Teatro Micaelense, a Ermida da Mãe de Deus e o Mercado da Graça.
Junto ao mar encontra-se o passeio marítimo, que é o ponto de partida para a realização de passeios de observação de golfinhos e baleias. Existem algumas empresas mas eu recomendo a que escolhi, a Futurismo Azores Whale Watching. É um percurso de três horas onde foram avistados vários golfinhos bem perto do barco e alguns cachalotes um pouco mais afastados. Nunca tinha visto estes animais em mar aberto, adorei.
6 – Lagoa do Fogo
O vulcão Água de Pau localiza-se sensivelmente na zona central de S. Miguel e na sua caldeira encontra-se a Lagoa do Fogo. Esta lagoa é a segunda maior da ilha, a mais alta de todas e está classificada como reserva natural.
As paredes da lagoa têm desníveis que vão até aos 300 metros e nessa envolvência encontra-se uma vegetação exuberante com plantas endémicas. É um paraíso natural que pode (e deve) ser explorado até à sua base, o que implica uma descida de cerca de trinta minutos.
7 – Salto do Cabrito
A cerca de dez kilómetros da Lagoa do Fogo, existe uma imponente queda de água com 40 metros. A água é cristalina e o pequeno lago que dá origem, convida a tomar um banho refrescante, se a temperatura o permitir.
O acesso a este local é feito por terra batida e é muito discreto. Pode não ser fácil, mas vale mesmo a pena pela paisagem e pelo sossego.
8 – Centro de Interpretação Ambiental da Caldeira Velha
Na Caldeira Velha existem campos fumarólicos provenientes do vulcão Água de Pau. É um local lindíssimo, com uma vegetação luxuriante, onde se encontram três piscinas de águas termais, com muito ferro e temperaturas na ordem dos 25-38ºC.
Neste Monumento Natural existe também o Centro de Interpretação Ambiental onde se encontra informação sobre a formação vulcânica de S. Miguel, assim como informações sobre a Caldeira Velha.
9 – Ribeira Grande
A pouco mais de 15 minutos de Ponta Delgada, encontra-se a cidade de Ribeira Grande. É uma das três cidades da ilha de S. Miguel, que é atravessada por uma ribeira de grande caudal que lhe deverá ter dado o nome.
Nesta cidade existem várias igrejas, praias com areal de grande extensão, museus, fábrica de licores, um farol, o Centro de Artes Contemporâneas (O Arquipélago) e a Fábrica de Cerâmica Micaelense. É aqui também que se encontra uma das maiores obras açorianas do século passado, a ponte dos Oito Arcos.
Dia 3
10 – Vila Franca do Campo
Vila Franca do Campo é o município mais antigo de S. Miguel, tendo sido criado no ano de 1476. Foi capital da ilha até 1522, ano em que ocorreu um violento sismo que deixou a vila quase toda soterrada. Foi reconstruída, mas nunca recuperou a sua importância, tendo perdido a condição de capital para Ponta Delgada.
Alguns anos depois do terramoto Vila Franca do Campo foi palco de uma das maiores batalhas navais travadas no mar dos Açores. Portugal perdeu a independência para os espanhóis, tendo aqui sido executados portugueses e franceses.
Um pouco relacionado com estes acontecimentos existem várias histórias e lendas que os açorianos gostam de contar sobre a sua terra. Diz-se que no ilhéu que se encontra a apenas 1 km da vila se avistam fantasmas brancos em noites de lua cheia…
Lendas à parte, o ilhéu de Vila Franca do Campo, também chamado de anel da princesa, é uma das fortes razões para visitar esta povoação. O ilhéu resulta da erupção submarina de um vulcão e na sua cratera existe hoje uma lagoa. Na época balnear é possível ir até lá e nadar numa piscina natural com cerca de 150 metros de diâmetro que comunica para o mar através de um pequeno canal. Um paraíso a não perder.
11 – Miradouro do Castelo Branco
O Miradouro do Castelo Branco situa-se a aproximadamente 20 minutos de Vila Franca do Campo. Na minha opinião é um dos melhores miradouros de toda a ilha.
Encontra-se assinalado por uma torre que foi mandado construir por um dos antigos proprietários do terreno. A porta está aberta, é possível subir e estar ainda um pouco mais alto. A paisagem é magnífica, vemos a toda a nossa volta, desde a Lagoa das Furnas, Vila Franca do Campo e o seu ilhéu e uma boa parte da zona ocidental de S. Miguel.
12 – Lagoa do Congro
A Lagoa do Congro foi a que mais gostei de toda a ilha. Esta é um pouco diferente da Lagoa das Sete Cidades ou do Fogo, uma vez que o processo que levou à sua formação não foi o mesmo.
Terá sido uma explosão de vapor no Sistema Vulcânico Fissural do Congro que foi responsável pela formação de uma cratera alargada e pouco profunda (onde agora se encontra a lagoa).
Para lá chegar é necessário deixar o carro na estrada de terra batida e descer um trilho a pé, por entre uma vegetação densa e luxuriante. Depois de uns bons 10-15 minutos chega-se a um local mágico.
A paisagem é de uma beleza esmagadora. A água tem uma cor verde muito forte e a vegetação à sua volta é tão densa que nem se consegue ver os bordos da cratera.
13 – Plantações e a fábrica do chá Gorreana
Na costa norte de S. Miguel encontra-se a mais antiga e única plantação de chá da Europa. É a Gorreana, uma empresa familiar em atividade desde 1883.
Ermelinda Gago da Câmara e o seu filho José Honorato decidiram abrir a fábrica poucos anos depois de dois especialistas chineses terem introduzido a arte de cultivar o chá na ilha. A plantação ocupa uma área de 32 hectares e a sua produção é totalmente orgânica. Não é utilizado nenhum produto químico, até porque as pragas normais não se desenvolvem no clima de S. Miguel.
Além de ser possível visitar as plantações, também dá para circular pela fábrica e se for em horário de trabalho, observar os trabalhadores a executarem as suas tarefas da mesma forma desde há vários anos. No café da fábrica há chá gratuito para todos.
Dia 4
14 – Lagoa das Furnas
O vulcão Furnas localiza-se no leste da ilha de S. Miguel e a sua caldeira encontra-se parcialmente ocupada pela Lagoa das Furnas. Foi aqui que ocorreu uma das maiores erupções vulcânicas alguma vez registadas nos Açores, no ano de 1630. Essa erupção gerou uma nuvem de fumo que não permitiu ver o sol durante três dias…
A caldeira tem uma dimensão de 8km por 5,6km, é uma área enorme e que para ser circundada necessita de três horas. Mas vale a pena, a vegetação que rodeia a lagoa é muito bonita. Do ponto de visto científico e pedagógico é um local de enorme relevância.
Há uma zona junto à lagoa que para aceder é sempre necessário pagar, independentemente de se chegar a pé ou de carro. Nessa zona é possível ver ou fazer o famoso cozido, um dos pratos mais emblemáticos desta ilha e dos Açores. Os ingredientes são colocados numa panela, que se enterra no quente solo geotérmico e deixa-se cozinhar durante cinco a seis horas. Mesmo para os que não são apreciadores de cozido, vale a pena provar um prato cozinhado com o calor da terra, emanado da atividade vulcânica.
Na primeira vez que visitei S. Miguel experimentei este prato num dos restaurantes. Desta vez optei por não repetir, uma vez que gostei da experiência mas não do sabor.
15 – Fumarolas da Vila das Furnas
Ainda no interior da caldeira do vulcão Furnas, encontramos outra área de fumarolas e nascentes termais e minerais. Fica mesmo na povoação das Furnas e é um local fantástico para observar a força da natureza e da terra.
Pelas várias fissuras da crosta terrestre existentes, é libertado vapor de água e gases, com um forte odor. Em algumas das pequenas caldeiras vemos água a borbulhar e outras são secas. Qualquer uma delas é muito interessante de observar. E não se esqueça de que está em plena caldeira de um vulcão.
16 – Parque Terra Nostra
O Parque Terra Nostra é um jardim botânico localizado no vale das Furnas e onde se encontra uma das maiores coleções de camélias do mundo (600 variedades diferentes). Também se encontra na caldeira do Vulcão das Furnas, tal como a lagoa e a vila.
Esta zona começou a tornar-se popular pela existência de centenas de nascentes e cursos de água mineral com propriedades perfeitas para o tratamento da obesidade e reumatismo. No ano de 1775 um rico comerciante americano mandou construir uma casa de madeira, um tanque e árvores à sua volta.
Outros proprietários se seguiram e várias remodelações e melhorias do espaço também, até ter chegado ao que vemos hoje. É um belíssimo parque com flora endémica dos Açores e de outros países do mundo, com um lago de água vulcânica e um tanque de água termal que é o ex-líbris da ilha. A água está carregada de sais minerais e a uma agradável temperatura de 35-40ªC.
Já foi considerado um dos mais belos parques do mundo.
Dia 5
17 – Miradouros do Nordeste
Se eu voltasse hoje a S. Miguel aterrava em Ponta Delgada e ia direta ao Nordeste. Não tenho qualquer dúvida que foi o que mais gostei. As paisagens são soberbas, quase mágicas e não há turistas. É aqui que se encontra o ponto mais alto da ilha, o Pico da Vara, com 1103 metros.
Toda a zona do nordeste é a parte mais antiga da ilha, uma vez que foi gerada por atividade vulcânica ocorrida há quatro milhões de anos. Aqui encontramos imensos vales floridos e escarpas imponentes e verdejantes que descem até ao mar, acompanhados por vários miradouros que permitem contemplar toda a beleza desta região de S. Miguel.
Recomendo parar em todos os miradouros que conseguir e tiver tempo, vale mesmo a pena. Cada um deles permite ter uma perspetiva única sobre a zona mais antiga da ilha, onde esta se começou a formar.
Destaco o miradouro Ponta da Madrugada e Ponta do Sossego.
18 – Povoação
A vila da Povoação encontra-se na região oriental da costa sul da ilha de S. Miguel. Foi aqui que chegaram os primeiros povoadores há seis séculos atrás, local que se encontra assinalado com um monumento em forma de porta.
Esta zona da Povoação foi resultante da atividade do vulcão da Povoação, seguido do aparecimento do vulcão do Nordeste. A zona ocupada agora pela vila é uma vasta depressão vulcânica, o que explica o facto de se encontrar num vale muito profundo.
Além do ponto de vista paisagístico, uma boa razão para visitar a povoação é também pela sua história. Aqui chegaram os primeiros povoadores da ilha e também foi aqui que foi construída a 1ª igreja de toda a ilha de S. Miguel, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário.
Dicas para viajar até S. Miguel
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Quando ir: O clima dos Açores é bastante peculiar. Chove durante quase todo o ano e a humidade relativa é muito alta. As temperaturas oscilam entre os 14 e os 25ºC, não existindo grandes amplitudes térmicas. Se quiser ir numa altura um pouco mais quente e com menos chuva talvez o melhor seja ir entre junho e agosto. Mas é um bom destino durante todo o ano.
Como chegar: Se for de Lisboa como eu, o melhor é apanhar um avião direto para Ponta Delgada. Eu voei com a TAP, como faço quase sempre.
Como se deslocar: De carro, sem qualquer dúvida. Vale a pena comparar os preços e escolher o melhor negócio na Rentalcars.
Onde dormir: A ilha é pequena por isso pode fazer sentido ficar sempre em Ponta Delgada. Mas depende muito do que é mais importante para si. Eu, numa viagem em família, com uma filha pequena, e para evitar a arrumação constante de toda a babagem, optei por ficar sempre em Ponta Delgada.
Fiquei neste hotel e recomendo: Hotel Azoris Royal Garde – Leisure & Conference Hotel.
Onde comer: O meu conselho é evitar os restaurantes de Ponta Delgada, estão super inflacionados. Se tiver carro vá a povoações nas proximidades, os valores são muito mais baratos.