Ao longo dos dias da roadtrip fui aos poucos percorrendo a Beira Baixa em direção a Este e no dia 5 cheguei ao município que está quase tão próximo de Madrid como de Lisboa. Esse município chama-se Idanha-a-Nova e é onde se localiza a mais que famosa Aldeia de Monsanto.

Mas penso que talvez fosse apenas isso, tudo o que eu sabia de toda a região de Idanha-a-Nova. Nem desconfiava que tinha sido por estas terras (mais exatamente em Penha Garcia) que nasceu o primeiro Geopark portugues, o Naturtejo, e que este já tem o “selo” da UNESCO. Há por aqui um património muitíssimo mais relevante e interessante do que eu poderia imaginar. Que bela surpresa.

Idanha-a-Nova 

A primeira coisa que visitei foi a vila de Idanha-a-Nova, mais precisamente as ruínas do seu Castelo. A edificação desta estrutura terá sido no longínquo século XIII, pela mão dos Templários, tal como aconteceu com o (Castelo) de Castelo Branco e o de Monsanto. Atualmente não resta muito dessa estrutura antiga, apenas um Cruzeiro dos Centenários, o que não belisca de nenhuma forma o interesse de uma visita. O simbolismo do local e a paisagem que proporciona ao olhar, é belíssima, ampla, sendo possível vislumbrar a fronteira com o país vizinho e mesmo ali “ao lado” Monsanto.

Um marco muito importante na paisagem e que é destacado no antigo castelo, é a Falha do Ponsul que atravessa Idanha-a-Nova e três outros municípios próximos, ao longo de 85 quilómetros e que continua para Espanha. Esta falha é uma estrutura tectónica, que foi formada há 300 milhões de anos, quando os continentes se aproximaram e formaram o supercontinente Pangeia. Assemelha-se a um “degrau”, ou seja, uma enorme escarpa que separa a superfície de Castelo Branco da superfície do Alto Alentejo. Incrível não é?

Descendo do antigo Castelo vale a pena percorrer as ruas empedradas da vila e embrenhar-se nos seus pequenos tesouros escondidos. Se for hora de almoço não perca uma visita ao restaurante Helana, totalmente orientado para altos padrões de sustentabilidade, reconhecido pela Green Key.

Idanha-a-Velha 

A 20 minutos de carro da vila de Idanha-a-Nova encontramos a belíssima Aldeia Histórica de Idanha-a-Velha. Esta povoação foi fundada pelos romanos e ao longo dos anos subsequentes foi ocupada por vários povos, tais como por exemplo os visigodos (lembram-se do rei Wamba e da lenda de Vila Velha de Ródão?), os suevos, os muçulmamos e os templários. Há por isso por aqui uma enorme mistura de vestígios e reminiscências de várias épocas e estilos, aos quais devemos estar atentos.

Quando chegamos à aldeia a primeira estrutura que observamos é a Porta Norte construída na época romana, que servia de acesso. É imponente e faz imaginar os muros robustos que a povoação teria à sua volta. Uns metros mais à frente chegamos a um largo onde rapidamente se destaca uma árvore e umas mesinhas no exterior em jeito de esplanada. Aqui fica um dos restaurantes mais interessantes da Beira Baixa ou até mesmo de Portugal, diria eu. Quem está por detrás deste projeto é Maria Caldeira de Sousa, uma simpática chef, que dedica a sua vida ao estudo da alimentação de outros tempos, da época dos romanos e à elaboração de pratos inspirados nesse povo. Almoçar por aqui é além de delicioso uma experiência imersiva na história de Idanha-a-Velha.

Seguimos. Temos ainda muito que ver. Várias capelas, igrejas, o forno comunitário, a ponte romana, o pelourinho e a torre dos Templários. Na viagem não se esqueça de se deixar envolver pelos “bons dias” ou sorrisos de quem está à porta de casa, disponíveis para ter dois dedos de conversa. Haverá melhor maneira de tocar na alma dos locais por onde passamos do que nos deixarmos envolver com as pessoas, com as suas histórias e as suas vivências?

Monsanto

E chegámos a Monsanto, eleita no ano de 1938, como a Aldeia Mais Portuguesa de Portugal num concurso promovido pelo Estado Novo. Ela ergue-se imponente e majestosa no alto de um monte que se destaca na paisagem maioritariamente plana ao seu redor. É um monte-ilha, ou seja, uma estrutura de granito que se “impõe” na paisagem e que vem sendo trabalhada pela erosão ao longo dos últimos 250 milhões de anos. Não me lembro de ter reparado neste contraste tão grande de paisagem. Que bom que já percebi agora.

No topo da elevação escarpada encontra-se o castelo que noutros tempos já teve uma enorme importância na defesa do país que era Portugal na época dos Templários. A vista a partir daí é incrível pelo que é obrigatório ir até lá, percorrendo a pé toda a subida, acompanhando o ligeiro serpentear das ruelas empedradas. É preciso subir com tempo, para que seja possível ir conhecendo alguns locais relevantes e para descansar… 

No caminho há várias igrejas e capelas para conhecer, solares, a casa do carrasco, um ou outro chafariz, uma gruta e as antigas casas onde permaneciam algumas temporadas os conhecidos Zeca Afonso e Fernando Namora. Mais próximo do castelo, já afastados da zona habitacional, mesmo quase a chegar aos últimos metros de declive, encontramos as furdas, que eram os locais onde os habitantes guardavam os porcos. Hoje em dia estão vazias, mas pelo que percebi ainda são utilizadas de forma pontual. 

Desde estas estruturas em pedra onde permaneciam os porcos até ao topo é um instante, sendo necessário um último esforço para contrariar a inclinação que parece cada vez maior. Chegado ao Castelo é hora de sentar e contemplar a monumentalidade da mãe natureza. Estamos a um pouco mais de 750 metros de altitude que parece imenso tal é contraste com o planalto que nos envolve.

Parque Icnológico de Penha Garcia

“Ao lado” do monte-ilha da aldeia de Monsanto (a dez quilómetros de distância) ergue-se uma outra estrutura imponente, chamada Penha Garcia. Da mesma forma que a Aldeia Mais Portuguesa de Portugal se destaca de imediato numa vasta planície, também tal acontece com esta aldeia de Penha Garcia. São ambas imponentes e fascinantes de conhecer.

Foi pelas condições que foram encontradas aqui em Penha Garcia que nasceu o Geopark Naturtejo, o primeiro a ser reconhecido como tal em Portugal. E tudo se deveu à descoberta de uma coisa chamada trilobite, que eu tinha ouvido falar pela primeira vez quando estive no Arouca Geopark. Sabia eu que estes duas regiões estavam ligadas de um certo ponto de vista.

Para percebermos a importância da existência de algo com um nome tão estranho para a maioria de nós, é preciso recuar 480 milhões de anos, a um tempo tão antigo que ainda nem tinham aparecido os nossos conhecidos dinossauros. Nessa altura Penha Garcia ficava na margem do supercontinente Gondwana e era banhada por um mar pouco profundo. Nesse mar viviam uns animais marinhos denominados trilobites. A terra mudou, as placas tectónicas mexeram-se, mas ficou a presença de rochas que estavam no fundo do mar e o vestígio do movimento desses animais marinhos.

O melhor sítio para observar as formações rochosas quartzíticas é a partir do Castelo ou da zona próxima dele e que está virada para a Praia fluvial. Repare nas enormes rochas que estão à sua frente, mesmo ao lado da barragem, e nas suas marcas de ondulação marinha.  O que é uma elevação hoje já foi o fundo do mar “ontem” e até é quase possível ver as ondas. Digam lá se isto é ou não é impressionante!

Agora é imprescindível descer dessa parte mais alta em direção à Praia Fluvial e encontrar os vestígios das trilobites que parecem “cobras pintadas” (procure o PR3 – Rota dos Fósseis). Esses rastros são as marcas dos percursos que esses animais marinhos faziam em busca de alimento. Por vezes aparecem no pavimento que pisamos, outras vezes nas rochas. É preciso estar atento.

Se tiver curiosidade em conhecer os fósseis dos animais marinhos propriamente ditos, tem de rumar a norte, até à região de Arouca, que estava submersa pelo mar e visitar o Museu dos Trilobites. Quando lá estive ficou por ver, mas da próxima vez não perco.

Praia fluvial de Penha Garcia

É neste contexto que surge um pequeno paraíso escavado nas rochas chamado Praia fluvial de Penha Garcia. À medida que nos deslocamos para lá e vemos o que mais parece uma piscina natural, é impossível não ter uma sensação de deslumbramento. As rochas altas, a cascata sobre a água, as pequenas casas de pedra e os moinhos antigos que estão próximos constituem “pormenores” que fazem com que toda a envolvência seja perfeita.

O melhor de Idanha-a-Nova (Beira Baixa)

Em redor da “piscina” existe pedra no chão e algumas árvores que dão uma boa sombra. Uns metros mais afastado da zona de banhos encontramos uma pequena área com relva onde se pode estender a toalha num piso mais confortável.

Em redor da “piscina” existe pedra no chão e algumas árvores que dão uma boa sombra. Uns metros mais afastado da zona de banhos encontramos uma pequena área com relva onde se pode estender a toalha num piso mais confortável.

A boiar na água está uma trilobite de brincar como que a relembrar o passado da região e o facto de ter sido o sítio onde o Geopark Naturtejo nasceu.

Explorei durante 6 dias a Beira Baixa a convite da Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa. Como sempre, os meus comentários são independentes.


Informação prática

Como chegar: Idanha-a-Nova localiza-se na Beira Baixa, região centro, a 263 quilómetros de Lisboa, um pouco mais do Porto, 177 de Coimbra e 70 da Covilhã. 

omo se deslocar: A melhor forma é deslocar-se na região de carro. Pode chegar  a Idanha-a-Nova de transporte público mas para chegar aos restantes locais da região deve ser um pouco difícil da mesma forma pelo que consegui perceber. Eu aluguei ainda em Lisboa um jeep com a Hertz Portugal e encaixou perfeitamente no estilo de viagem que eu fiz por toda a Beira Baixa, uma vez que percorri pontualmente alguns troços fora da estrada. Se puderem façam o mesmo!

Onde dormir: Idanha-a-Nova tem várias possibilidades de alojamento, desde hotéis a unidades de alojamento local. Eu optei por ficar em Monsanto na Casa do Chafariz e gostei da experiência de não ter de deixar a aldeia no fim do dia. Gosto muito de passeios noturnos.  

Se optar por ficar em Monsanto recomendo que tenha atenção aos pequenos-almoços se tal não estiver incluído no alojamento. É possível que tenha de sair da aldeia. Tenha isso em conta.

Onde comer: Pode optar pelo restaurante Helana mesmo na vila de Idanha-a-Nova ou por fazer um pic nic junto à praia fluvial de Penha Garcia. Espreite as possibilidades da empresa Geocakes que é incrível. 

Para jantar, se ficar como eu em Monsanto pode ir a um dos restaurantes da terra, se tiver reservado ou então meter-se no carro e rumar à Aldeia de João Pires e comer qualquer coisa no Café Bar A Ponte. Comida honesta, a um bom preço.

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