Alcoutim é uma pequena vila do interior do Algarve, com um pouco menos de 500 habitantes. É banhada pelo Guadiana, o Grande rio do sul como muitos o chamam, dado ser um dos maiores do país e mesmo de toda a península ibérica. Do lado oposto encontra-se Sanlúcar de Guadiana e apesar de já ser um outro país, sente-se uma ligação próxima entre as duas margens, que se confirma pela história.

Tempos houve em que nesta região existiram rotas de contrabando de mercadorias que hoje em dia são eternizadas pelo festival que decorre anualmente de ambos os lados do rio. Essa ligação comercial e afectiva é recordada com um evento transfronteiriço constituído por um mercado à moda antiga, ofícios tradicionais, jogos populares, teatro de rua, música popular e muita gastronomia local, entre muitas outras actividades.

Aqui ficam 10 razões para visitar Alcoutim.

1 – Está integrada no território do baixo Guadiana

Alcoutim localiza-se no Algarve, numa região denominada Baixo Guadiana. Este é um território único onde podemos encontrar sol, mar, serra, barrocal (que é uma zona de transição entre o litoral e a serra), o rio Guadiana e zonas húmidas como sapais e salinas. Apresenta uma riqueza natural idílica que por si só já é uma razão mais do que suficiente para partir à descoberta. Para tomar contacto com esta paisagem recomendo reservar uns cinco ou seis dias e fazer um passeio demorado entre o Parque Natural da Ria Formosa, já na zona da Manta Rota e Cacela Velha até Alcoutim, passando por Vila Real de Santo António e Castro Marim, sempre procurando viajar o mais próximo possível junto ao Guadiana.

Neste percurso vai passar por belíssimas localidades, assim como pela Reserva natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António, pelo Parque natural da Ria Formosa, pela Mata Nacional das Terras da Ordem e a das Dunas Litorais de Vila Real de Santo António e pode ver camaleões, lebres, raposas, javalis e várias aves aquáticas como flamingos ou a cegonha branca.

10 razões para visitar Alcoutim
Vale do Guadiana. Alcoutim localiza-se na margem esquerda, do lado esquerdo da foto

2 – Localiza-se na margem do Grande rio do sul

A vila de Alcoutim localiza-se na margem direita do rio Guadiana, o que teve uma importância enorme em toda a sua história. O rio dos patos, ou o Grande rio do sul como também é chamado, tem de ser visto não “apenas” como um rio, mas sim como uma auto-estrada. É que durante muito tempo o Guadiana foi um importante eixo comercial entre Portugal e o amplo mundo do Mediterrâneo. Alcoutim, que já era ocupada desde a pré-história, registou um enorme desenvolvimento nesta época de grande trânsito de pessoas e mercadorias.

É muito interessante ter noção desta realidade numa visita ao território do Baixo Guadiana e em particular a Alcoutim. Eu que gosto de história e de imaginar como as coisas terão ocorrido, adorei sentir-me nos tempos dos romanos ou dos árabes, ao subir o Guadiana desde Vila Real de Santo António e imaginar como deve ter sido tomar a decisão de não seguir em frente para a costa do Algarve até ao oceano Atlântico e entrar por uma via mais tranquila e segura, descobrindo novos lugares e novas oportunidades. Alcoutim começou assim.

3 – O enquadramento da vila é lindíssimo

A poucos quilómetros de Alcoutim, pela Estrada Municipal 507 rapidamente nos apercebemos de que Alcoutim tem a beleza perfeita de um quadro. Nesta estrada existem muitas curvas e contra curvas que nos impossibilitam ver longe, mas logo a seguir a Guerreiros do Rio é-nos dado um rápido vislumbre do casario branco da vila, mesmo junto à água. Desde Cacela Velha que são boas surpresas umas logo a seguir às outras e sem dúvida que Alcoutim é uma delas.

Eu sou Algarvia, conheço relativamente bem o Algarve, já tinha andado muitas vezes por esta zona do baixo Guadiana, mas nunca tinha feito um percurso apenas dedicado ao rio, mas sim apenas partes dele. E isto pode ser um detalhe mas na verdade tive a impressão de que a experiência foi bem diferente.

4 – O núcleo histórico tem muito por explorar

Os vestígios mais antigos encontram-se em zonas próximas da vila de Alcoutim, mas por volta do século XIII foi fundada a povoa de Alcoutim, tendo em vista o povoamento e a defesa da fronteira com Espanha. O local onde se encontra hoje em dia a vila pareceu perfeito do ponto de vista estratégico ao rei D. Dinis. E assim sendo, foi edificado um castelo e a povoação começou a desenvolver-se a partir desse ponto até ao que vemos atualmente.

Numa visita ao núcleo histórico de Alcoutim é recomendado visitar o castelo cristão e as duas exposições do Núcleo Museológico de Arqueologia, a Igreja Matriz de São Salvador, a Ermida de Nossa Senhora da Conceição, o Cais do Guadiana, a Rua Direita que era uma das artérias mais utilizadas na época medieval e as várias casinhas de tipologia dessa altura.

5 – A vista do Castelo velho é magnífica

Quando os muçulmanos chegaram à região de Alcoutim encontraram vestígios da civilização romana que ocupava a margem do rio Guadiana, refletindo a estreita ligação com a via fluvial na circulação de produtos para o império romano. Ainda hoje podemos visitar a villa do Montinho das Laranjeiras, que não fica muito longe da vila e perceber que de facto esre povo vivia totalmente virado para o Guadiana. A importância do rio foi perpetuada no período islâmico, através da necessidade de construção de uma fortificação que vigiasse a grande via fluvial, garantindo o comércio de vários produtos  e a vigilância e proteção das populações.

10 razões para visitar Alcoutim
Villa Romana do Montinho das Oliveiras

Como há um outro castelo construído muitos anos mais tarde no centro de Alcoutim, o que foi construído antes ficou conhecido como “velho”. A vista a partir de lá para a vila e para uma boa parte do vale do Guadiana é soberba.

Este castelo foi construído no século VIII/IX pelos muçulmanos e foi residência de alguém que tinha funções militares de controlo do rio Guadiana e da exploração dos seus minérios.

6 – Tem colecção única no país de jogos de tabuleiro e pedras de jogo do período islâmico

Em anos recentes a Câmara Municipal de Alcoutim realizou algumas escavações arqueológicas no Castelo Velho e descobriu cerca de 40 jogos de tabuleiro e pedras de jogo. Esta descoberta é fantástica porque nos permite conhecer quais eram as atividades de lazer dos muçulmanos que ocupavam a fortificação. A um certo ponto da história o castelo tinha uma função militar de controlo, pelo que os seus ocupantes teriam algum tempo livre. Sabemos agora o que faziam em alguns dos seus momentos “mortos”.

Muitos jogos dessa época ficaram perpetuados em vários países por onde os muçulmanos passaram. Em Portugal por exemplo todos conhecemos o jogo do galo, o das damas ou o três-em-linha. É incrível imaginar que há muitos séculos atrás já soldados se sentavam no castelo velho de Alcoutim a jogar algo muito parecido.

7 – Tem uma bela praia fluvial

A ribeira dos Cadavais, um afluente do rio Guadiana banha a praia fluvial Pego do Fundo, que é uma das praias fluviais mais interessantes que eu conheço em Portugal. Localiza-se muito perto da zona central de Alcoutim e é um local muito procurado nos dias quentes. Além do areal há também um café e restaurante, um parque de merendas e campo de voleibol por exemplo.

Se forem com crianças tal como eu, vale a pena reservar um dia para ficar aqui e relaxar. Claro que se não for (com crianças), também merecem!!!

8 – Tem uma relação muito próxima com Sanlucar de Guadiana (Espanha)

Todo o território do baixo Guadiana é banhado pelo rio que dá nome a esta região, mas é em Alcoutim onde ambas as margens estão mais próximas entre si, a apenas 220 metros de distância, ou seja, a pouquíssimos minutos de barco. Por este facto sempre que visito Alcoutim sinto uma certa continuidade com o outro lado do rio, como se o Guadiana fosse apenas uma estrada a separar duas ruas…

Sanlucar do Guadiana e Alcoutim são duas povoações com muitos séculos de história em comum, baseada em trocas comerciais e no cruzamento de famílias. Tudo isto deu origem a uma enorme ligação e cumplicidade entre os dois lados que estavam “longe” dos grandes centros urbanos de maior importância dos respectivos países (Portugal e Espanha) e tão próximas uma da outra. Sobreviveram em entreajuda.

Essa forte ligação entre os dois lados do rio é bem evidente quando passeamos em Sanlucar e apercebemo-nos da população espanhola mais idosa misturar várias palavras portuguesas no seu discurso ou de “aportuguesar” algumas palavras espanholas.

9 – Pela história do contrabando

Alcoutim e Sanlucar do Guadiana são povoações de países diferentes (Portugal e Espanha), mas têm a mesma história. Durante muitos anos sentiram na pele a distância dos grandes centros e partilharam a mesma realidade política. Estas condições levaram a que os habitantes de ambas as margens do Guadiana tivessem desenvolvido acções de sobrevivência para sustentar a família, tal como foi o comércio ilegal, também chamado de contrabando.

Calcula-se que este contrabando tenho sido praticado quase desde o momento em que foi definida a fronteira entre os dois países, mas a época em que se intensificou ocorreu no século XX, especialmente nos anos da Guerra Civil Espanhola (de 1936 a 1939) e nos anos posteriores a estes, que juntamente com a II Guerra Mundial deixaram nesta região um cenário de miséria e fome. Por esta altura havia um enorme controlo de ambos os lados, com vários postos da Guarda Fiscal e da Guardia Civil ao longo do rio, pelo que os contrabandistas tiveram de procurar algumas soluções, tornando-se mais organizados.

A passagem de mercadoria pelo Guadiana era uma actividade muito perigosa e os homens que o faziam arriscavam ir para a prisão se fossem apanhados pelos guardas ou até mesmo perder a sua vida devido à corrente do rio ou se fossem descobertos. Esta actividade era de subsistência, pelo que muitas vezes os guardas portugueses que eram da terra “fechavam os olhos” a algumas coisas que iam sabendo e vendo, até porque a terra era pequena e a probabilidade de um contrabandista ser familiar de uma guarda era grande. Mas do lado de Espanha os caribineros, em plena Guerra Civil Espanhola, tinham uma atitude totalmente diferente e atiravam para matar. Por esta razão é que eram os portugueses que ponham as sacas às costas e atravessavam o rio e não os Espanhóis que tinham terror ao que lhes pudesse acontecer.

Eram tempos difíceis, muito difíceis, em que muitos arriscavam tudo para a família ter o que comer. Esta memória ainda está bem presente em alguns idosos e nas gerações mais recentes. É indissociável da história de Alcoutim.

10 – Pelo Festival do Contrabando

A actividade de contrabando entre ambos os lados do Guadiana (Alcoutim e Sanlucar do Guadiana) é lembrada todos os anos com o Festival do Contrabando. Este ano pelo contexto actual em que vivemos não ocorreu mas para o ano em março tenho a certeza de que se farão todos os esforços para ser concretizada a próxima edição.

Neste evento é colocada uma ponte flutuante sobre o rio, decorrendo todos os projectos culturais em ambos os lados da fronteira. Há mercados de artesanato, circo, fado, exposições, arruadas, oficinas e muito mais. Que a ligação de sempre existiu entre ambos os lados do rio nunca morra. Para o ano lá estarei!!! Fiquei mesmo muito curiosa com este festival.

Um muito obrigada à Região de Turismo do Algarve e Câmara Municipal de Alcoutim por todo o apoio na blog trip de três dias que me permitiu conhecer bem a região de Alcoutim. Como sempre, os meus comentários são independentes.


Informação prática

Como chegar

Se for de carro até Alcoutim conte com cerca de três horas de Lisboa, cinco do Porto e uma de Faro. Não há vias rápidas até lá, pelo que utilizando a Nacional e/ou a Estrada Municipal é sempre um pouco mais lento. Se for de sul recomendo chegar à vila pela via mais próxima do rio Guadiana (EM 507), a paisagem é lindíssima.

Optando por transportes públicos (comboio ou autocarro) vai ter sempre de ir ao Algarve litoral (Faro ou Vila Real de Santo António por exemplo) e depois apanhar um autocarro para a vila.

Como se deslocar

Se quiser apenas explorar a vila basta andar a pé. No entanto recomendo aproveitar e conhecer também o concelho e para isso já vai necessitar de ter o seu transporte. Tenha em mente que não há nenhum local em Alcoutim para alugar carro, sendo o sítio mais perto para o fazer Monte Gordo, a 35 quilómetros. Compare os preços e as várias possibilidades em Rentalcars. Sempre que alugo é aqui que vejo.

Onde dormir

10 razões para visitar Alcoutim

O melhor local para ficar a dormir é o Hotel D´Alcoutim, sem qualquer dúvida. Localiza-se a uma caminhada de 13 minutos da zona mais central da vila, junto ao rio, é super elegante, o staff é fantástico (incluindo o dono) e tem uma piscina no exterior com imenso espaço à sua volta. O pequeno almoço é agora servido à mesa em intervalos de 30 minutos previamente marcados para manter a segurança.

Onde comer

A vila de Alcoutim não é muito grande pelo que a nível de restaurantes, na zona mais central tem pouco mais do que o Camané na praça da República e o Sítio do Costume muito próximo do Cais. Quer um quer outro deverá comer razoavelmente bem. Recomendo reservar mesa no terraço do Sítio do Costume com indicação já do que pretende comer, para evitar eventuais longas esperas.

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